domingo, 27 de setembro de 2015

Audição Cega, Visão Atenta

Uma emissora em desespero por um programa de sucesso e uma fórmula holandesa que juntava estrelas da música, shows e cadeiras giratórias. Quando a rede de tv americana NBC resolveu fazer uma versão estadunidense de "The Voice", criou um fenômeno mundial que ganha versões em diferentes países e faz estrondoso sucesso por aí. Para a NBC, foi o alívio necessário, para o público, uma ótima opção de diversão. "The Voice" se consolidou como marca e sinônimo de audiência e sua exibição mobiliza um bom público em torno de uma competição musical com alguns elementos diferentes dos demais programas.


Embora exista uma versão nacional para o The Voice, quero me concentrar na versão estadunidense, que estreou sua 9ª temporada na última semana. O programa chama a atenção pelas fases de seleção de candidatos, principal atrativo da competição. As chamadas Blind Auditions, onde os técnicos ficam de costas para apenas ouvir a voz do candidato, sem julgá-lo por outros parâmetros, é a principal marca e o que dá origem ao nome "The Voice".

Confesso que, apesar do interessante jogo de escolhas de candidatos e o fato dos técnicos formarem times e treinarem quem os escolhe (o poder de decisão na mão do candidato), o que me fez acompanhar a primeira temporada do "The Voice" americano foi o time de técnicos. Cee-lo Green e Christina Aguilera são dois artistas que admiro e queria ver apenas a desenvoltura dos dois. Logo, porém, fiquei completamente imerso e viciado naquele jogo entre técnicos e candidatos. "The Voice" se tornou um grande vício e aquela competição por algum tempo era tudo o que eu gostava de ver e rever.


injustiçada, vencedora

Foi provavelmente por ver demais que o "The Voice" começou a me desencantar. O primeiro sinal era o desânimo quando começava a fase final do programa, as apresentações ao vivo. Ali mora a decepção. É nos shows ao vivo que o programa deixa de inovar, e principalmente é nos shows ao vivo que a fórmula "The Voice" comprova sua fraqueza.

Em princípio eu pensava ser culpa do público que vota utilizando parâmetros além da voz. Mas com o tempo, percebe-se que até os técnicos observam os candidatos além da voz. O julgamento apenas pela voz é falácia e acaba cedendo a imagem, seja pelos técnicos ou quando o poder de decisão passa para o público.

Grande exemplo disso é a falta de critério em torno das eliminações quando elas passam para o âmbito do telespectador. É claro que vozes diferentes despertam atenções e criam fãs diferentes, além disso cada semana o artista tem de se renovar para capturar de novo a atenção do público. Porém, a cada edição o público votante fica mais perdido. Se em uma temporada bons candidatos são eliminados por cantarem muito alto ou por se repetirem demais, em outra sagra-se vencedor quem mais grita ou quem cantou basicamente o mesmo tipo de música durante todo o  programa (leia-se quinta e oitava temporada).



injustiçada, vencedora =`(

 Em questão de gostos pessoais, é claro que há diferenças entre o que o público acaba gostando. O que irrita aqui é que a voz, principal mote do programa, uma hora ou outra é deixada de lado. A imagem influencia sim nas decisões de técnicos e público, o que faz com que o "The Voice" oscile muito em sua proposta. Quem acompanha com tanto afinco percebe isso claramente.

Não que "The Voice" seja uma farsa. O programa já teve e tem momentos incríveis, a interação dos técnicos diverte e não há uma temporada que não surja alguém sensacional. O problema é que, depois de tanto acompanhar, percebe-se que a voz não é o único critério utilizado por público e técnicos para definir quem é realmente a voz, o que deixa tudo muito sem sentido. Fica um vazio dentro do sucesso, o programa se torna a mais cruel das competições musicais, pois aquilo que prega e tenta vender não acontece. Resta esperar que o público que vota perceba que seu julgamento está muito além da voz, ou se conclui que o público é mais cego do que as audições do programa.


domingo, 20 de setembro de 2015

Who Watches the Watchmen?

Um trauma e um desejo inerte de se fazer o bem. Esses são os componentes essenciais dos heróis clássicos. Normalmente esses mesmo heróis são atemporais, o Homem-Aranha sempre será jovem, o Super-Man nunca envelhecerá, mas e se seres humanos de verdade fossem retratados como super-heróis as coisas seriam diferentes. “Watchmen” trata de uma forma mais “pé no chão” o conceito de herói,  como os seus traumas não só são um estopim para fazê-los agir, mas também afetam eles psicologicamente.

Sendo lançado em formato de 12 edições pela DC Comics em 1986, a história foi escrita por Alan Moore, chamado carinhosamente de Mago dos Quadrinhos. Esse gênio foi responsável por vários das mais incríveis historias em quadrinhos, dentre suas obras primas estão “V for Vendetta”,  “Killing Joke” e “The League Of Extraordinary Gentlemen”O escritor tende a tratar de problemas mais sérios do que é usual pra histórias em quadrinho até mesmo em "Watchmen" ele prefere usar problemas reais como estupro e prostituição para a criação dos traumas dos personagens






         Vendo o mundo sobre outra perspectiva, além de trazer o mundo real pras história pessoais dos personagens, Moore também mostra como seria diferente o mundo com heróis. Como isso afetaria o conceito de vilão, como eles agiriam durante guerras, a reação do governo e da mídia a respeito do fenômeno. É muito interessante o próprio mundo que os heróis vivem, ele é muito rico de detalhes, desde outros heróis que se aposentaram, ou que morreram, a ação deles durante a Guerra do Vietnam. Tudo que os personagens vivenciam aprimora eles próprios, eles vão mudando de acordo com o tempo que se passa. Alguns usam o fato de lutar contra o crime pra expressar seus sentimentos reprimidos, outros o fazem para se sentirem com algum controle na vida e poucos que fazem pelo bem verdadeiro conforme o tempo ou mudam de perspectiva ou deixam de ser heróis. 

          A história começa muitos anos após o ínício de uma lei que proíbe a atuação de heróis nos EUA, mas um antigo herói (Comediante) é morto, quando seus antigos parceiros resolvem investigar o que aconteceu eles se encontram em uma grande conspiração. A trama é intercalada por flashbacks dos tempos áureos dos heróis, quando suas ações eram apreciadas e o governo contava com eles. Esse formato de flashbacks é interessante pois sempre se mostra os pontos de mudança dos personagens, o que aconteceu para que se tornem o que são e a perspectivas deles sobre o mundo.


"Ouvi uma piada uma vez: Um homem vai ao médico, diz que está deprimido. 
Diz que a vida parece dura e cruel. Conta que se sente só num mundo ameaçador 
onde o que se anuncia é vago e incerto.
O médico diz: "O tratamento é simples. O grande palhaço Pagliacci está na cidade,
 assista ao espetáculo. Isso deve animá-lo."
O homem se desfaz em lágrimas. E diz: "Mas, doutor... Eu sou o Pagliacci."
Boa piada. Todo mundo ri. Rufam os tambores. Desce o pano. "


            Concluindo, o história em quadrinhos é uma obra de arte, sem tirar nem por. Mas o tratamento de assuntos bem maduros torna a recomendação meio circunstancial, pois não são todas as pessoas que gostam de ser jogadas em uma realidade tão cinza e suja. Então eu deixo aqui a minha mais alta apreciação, mas se quiserem ler estejam avisados de que tem um conteúdo muito adulto.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Um pouco de Música: Years & Years

Reinvenção e nostalgia. Estas são as palavras de ordem da banda que se destacou nas paradas britânicas no primeiro semestre de 2015. O Years & Years mistura sintetizadores que lembram o cenário eletrônico dos anos 90, ao mesmo tempo que repaginam com elementos do R&B o som viciante da banda. Como não poderia deixar de ser, os clipes  são sempre bem criativos e a aposta em uma identidade visual chamativa coloca-os em grande evidencia e destaque no cenário pop atual.


Muitas coisas funcionam bem no Y&Y. As letras são bem escritas e a voz do vocalista Olly Alexander é diferente e casa com a proposta do som que a banda faz. De certa forma, o Years & Years consolida o eletropop como um estilo de música que consegue resgatar elementos usados em exaustão e tirar deles algo bastante inovador. O som aqui é mais concreto, ousado e interessante que boa parte dos artistas e bandas que se arriscaram no estilo, mesmo que estas tenham entregado ótimos trabalhos, como fizeram o Two Door Cinema Club e o Foster the People, citando exemplos recentes.

"Communion", disco de estréia da banda é uma sucessão de acertos e surpresas. O que ás vezes é chamado de "música indie" acabou ganhando aqui um ótimo representante. Ele começa com a faixa introdutória Foundation, e a sequência inicial é com as grudentas Real, Shine, Take Shelter (melhor faixa em minha opinião) e Worship.

"do what you want tonight"

 Eyes Shut, sexta faixa, mostra que não se trata de um disco completamente voltado para as pistas, evidencia o talento musical dos integrantes da banda e tem ótimos vocais, o que a torna uma faixa especial. O disco segue com Ties, as ótimas King e Desire e sua sequência final (Gold, Without, Border e Memo), embora seja menos chamativa não compromete a beleza do trabalho.

O Years & Years tem chamado cada vez mais atenção com um som que aparentemente não tem nada de muito novo mas que busca em elementos mais antigos sua sofisticação. A banda tem som e identidade visual bem montadas e mesmo que esses elementos sejam voltados para o consumo, acabam mostrando  o som atual, jovem e bem feito que eles fazem. Communion é um disco fácil de ouvir, gostar, viciar e achar (está aí pela internet) e a banda demonstra que o eletropop, mesmo que exaustivamente utilizado atualmente, ainda tem fôlego e pode apresentar coisas ótimas.

b-side excelente





domingo, 6 de setembro de 2015

O Fim Glorioso De Uma Jornada

De tempos em tempos, a indústria de vídeo games elege um jogo como o epítome das novas tecnologias, no ano de 2015 esse cargo pertence ao trabalho final da trilogia “The Witcher”. Sendo considerado por muitos a melhor tradução das capacidades técnicas da oitava geração de consoles de mesa, “The Witcher 3: Wild Hunt” é o jogo favorito para ganhar o prêmio de “Game Of The Year”.


O inicio da PI (propriedade intelectual) foi nas mãos de um autor polonês chamado Andrzej Sapkowski que publicava contos sobre bruxos caçadores de monstros numa revista de ficção científica de nome “Fantastyka”. Os vários contos escritos depois foram compilados em livros de romance que seguiam um bruxo chamado Geralt of Rivia. Após muitos livros de sucesso considerável, uma desenvolvedora de games polonesa conhecida como “CD Projekt RED” transformou as histórias do autor em uma trilogia de jogos no estilo RPG ocidental.




Os jogos dão uma visão à história de Geralt of Rivia, assim como os livros, mas trazem junto fatores que apenas essa mídia possui. Pelo fato do gênero ser RPG e isso levar a escolhas do jogador para definir o andamento da história, isso faz com que todas as interações com personagens importem mais para o jogador num nível pessoal.


A desenvolvedora acertou em cheio no aspecto mais importante do jogo, fazer com que o jogador se sinta como um bruxo. Tudo que é utilizado para caçar os monstros é feito de uma maneira interessante, com rastreios, pesquisas, preparo e a otimização de equipamento. A terceira instalação da franquia tentou alcançar todos os limites que teve oportunidade em questões técnicas, os mapas são maiores que qualquer outro jogo lançado até então, os gráficos utilizam uma grande parte do potencial da nova geração, a trilha sonora é uma obra de arte por si só. Além disso, o jogo trás para quem jogou os antecessores um grande elenco de antigos personagens que estarão presentes para o fim da história de Geralt.





Apesar de o jogo ter acertado até nos aspectos de RPG, como a progressão de equipamentos e sistema de missões, nem tudo é um mar de rosas. A desenvolvedora tentou alcançar os limites estabelecidos pela tecnologia, mas talvez tenham dado um passo maior que a perna. O jogo na versão atual é repleta de defeitos, desde carregamentos que nunca acabam, problemas na administração de jogos salvos, travamento completo do jogo. Os responsáveis tentam corrigir esses bugs conforme são reportados, mas isso resulta em atualizações ridiculamente grandes que não corrigem tudo, por que além das correções vêm juntas mudanças em estética e no equilíbrio de itens, coisas que deveriam ter sido aperfeiçoadas e finalizadas antes do lançamento do jogo. E por mais que a história seja bem pessoal para quem jogou os anteriores, se o jogador for um novato da franquia ele vai acabar se sentindo como um estranho na conversa entre velhos amigos, meio deslocado.


Finalizando, o game tem seus méritos, mas ele está longe de ser perfeito ou até mesmo o epítome da nova geração de consoles de mesa, pois ele não trabalha bem com suas próprias limitações. E a respeito dele ser o “Game Of The Year”... Bem... O ano não acabou.